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Marcia Telles

Salva-vidas de adolescente


Um jovem que prestará vestibular neste ano me enviou uma mensagem quase desesperada. Ele diz que sempre foi bom aluno e que sua vida escolar jamais foi motivo de preocupação para ele ou para seus pais.


Nunca precisou estudar muito para ter boas notas, fazia lições e trabalhos sem muita vontade, mas sabendo que precisava fazê-los para ter boa avaliação –ele tinha tomado para si essa responsabilidade como estudante.


As provas, contou ele, nunca foram motivo de ansiedade. Aliás, várias vezes ele simplesmente se esqueceu de olhar o calendário e, mesmo de surpresa, enfrentou as avaliações e saiu-se bem.


A questão é que, desde o início deste semestre, passou a ficar muito ansioso tanto com as provas na escola quanto com a ideia dos exames que tem de prestar para entrar na faculdade que deseja. Não consegue dormir bem na véspera do dia da prova, tem pesadelos, fica gelado e sempre com a sensação de que vai desmaiar.


Aliás, um pesadelo tem sido recorrente: o de que, quando faz a prova do vestibular, é flagrado portando um dispositivo tecnológico proibido e, dessa maneira, sua inscrição é anulada.


Nem é preciso dizer que, depois desse sonho atormentado, ele acorda passando mal e fica o dia inteiro sem conseguir se livrar da imagem de seu sonho.


Desejoso de um apoio, puxou conversa com o pai e tentou contar a ele o que estava acontecendo. O pai, certamente com a intenção de acalmar o filho, disse uma frase que piorou a situação de nosso jovem leitor.


“Você nunca teve problemas com provas, filho, não vai ser justamente na prova mais importante da sua vida que você vai falhar.” Depois de ouvir essa frase, nosso jovem ficou mais pressionado ainda. Ele entendeu – nem sei se foi intenção do pai passar tal mensagem – que ele não pode falhar.


Ele também tentou pedir ajuda a um professor, mas recebeu de volta o que ele chamou de “um discurso motivacional” que fez efeito zero.


Esse jovem, como tantos outros nesse momento, pediu ajuda e não teve acolhimento. Ele ainda foi direto ao ponto, mas há jovens que pedem ajuda de maneiras desajeitadas porque não têm clareza de que querem pedir ajuda. Seja o pedido feito de forma direta ou indireta, poucos são acolhidos.


Temos tido dificuldades em reconhecer a importância do nosso papel na jornada final de filhos e alunos. Não podemos deixar de perceber que muitos estão quase se afogando e precisam de uma boia que os ajudem a se salvar.


Não temos ouvido os pedidos de ajuda que nos são lançados ou ouvimos, mas acreditamos que, mesmo em dificuldade, eles conseguirão se virar sozinhos e superar o obstáculo que enfrentam.


Alguns irão mesmo, não duvido disso. Mas poderiam sofrer bem menos e chegar ao mesmo resultado se sentissem que não estão sozinhos no final de sua jornada.


Outros, entretanto, poderão ficar rodando em círculos justamente por não encontrarem um incentivo, uma ajuda, uma companhia no momento difícil pelo qual passam. E, depois de um tempo, até podem acha um caminho, mas não precisariam passar por esse sofrimento inútil.


A passagem da infância para a adolescência costuma ser um período de crise, difícil para filhos e pais. Pois a passagem da adolescência para a vida adulta também. Por que não assistimos nossos filhos e alunos nessa transição?


É bom lembrar que nosso papel educativo só termina quando os mais novos conquistam a maturidade. Até o último momento antes disso, precisamos estar a postos em nosso papel.


Quando não fazemos isso, retardamos a maturidade em vez de precipitá-la. Talvez por isso tenhamos tantos jovens adultos imaturos na atualidade.



Rosely Sayão - Folha de São Paulo

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