Contar a vida, compartilhar vivências é essencial para que o relacionamento amoroso se estabilize e fortaleça. No entanto, há um dilema que aflige os casais, principalmente quando se conhecem e estão muito apaixonados: o excesso de confidências. É preciso encontrar o limite entre a intimidade e o desrespeito, para manter o nível da convivência.
A privacidade num relacionamento amoroso é terreno arriscado, cheio de sutilezas e armadilhas. Exige dos parceiros um bocado de sensibilidade e diplomacia. Se, por um lado, uma relação afetiva implica compartilhar a vida com outra pessoa, dividindo alegrias, dificuldades, emoções, dúvidas, medos e desejos, por outro é preciso estar atento à fronteira entre o compartilhar e o invadir. Muitas pessoas acreditam que viver uma relação verdadeira e profunda significa abrir-se completamente, contar tudo que sentem, o que vivem e o que viveram. É claro que conhecer a história do outro e trocar experiências são fundamentais para que o vínculo se estabeleça e permaneça. Mas será necessário contar tudo? No início do relacionamento, no auge da paixão, amantes trocam confidências de forma ingênua, seguros de que encontraram quem os completa, entende e apóia sem restrições. Neste momento, não existem julgamentos, divergências; somente união. No entanto, em conseqüência dessa exposição excessiva, logo começam a surgir mal-entendidos, repreensões e ciúme. Mas não é apenas na fase do encantamento que o excesso de exposição pode ocorrer. Em diversos momentos os parceiros acreditam que merecem ou têm o direito de saber certas coisas, e acabam interrogando o outro, seja de maneira sutil, seja apelando para tons mais agressivos. O parceiro, por sua vez, muitas vezes acaba entrando no jogo, por temer uma discussão, briga ou rejeição caso não aja como o outro espera, ou até por achar que, ao contar intimidades, terá a possibilidade de cobrar a mesma atitude em reciprocidade. Em uma outra vertente, existem pessoas que sentem satisfação e certo triunfo ao gerar insegurança no parceiro ou na parceira. Por isso revelam episódios que não lhes foram perguntados. Por exemplo: contam cantadas recebidas ou revelam intimidades de seu passado como forma de desestabilizar o outro. Essas pessoas costumam exaltar o valor de suas confidências, dando-lhes uma roupagem politicamente correta, de quem está prezando a sinceridade acima de tudo. O companheiro se vê obrigado a lidar com verdades que não reivindicou. Nesse sentido, torna-se importante lembrar que, assim como é agressivo termos nossa intimidade devassada, obrigar o parceiro ou parceira a escutar certos fatos nem sempre significa honestidade; pode ser também uma tentativa de feri-lo ou mesmo de devastá-lo. Dinâmicas dessa natureza não oferecem nenhum ganho à relação e trazem prejuízos a ambos os parceiros, gerando ressentimentos e desconfianças. Negociar limites é uma missão difícil. Não é simples aceitar ficar por fora de certos aspectos da vida do outro; mas é necessário manter o respeito e o bom senso. O companheiro, por sua vez, deve conquistar o respeito agindo com grande consideração e cuidado com as emoções despertadas. Afastar os entimentos de rejeição, fazendo com que a pessoa amada se sinta incluída em seu mundo, e ter iniciativas que aumentem sua autoconfiança, são atitudes que preservam o equilíbrio da relação. Não temos como determinar até que ponto a comunicação de um casal pode ser considerada saudável. As pessoas têm limites próprios e cada relação desenvolve uma dinâmica diferente. Então, cabe a cada um fazer o exercício de discernir o que é pertinente compartilhar daquilo que diz respeito apenas a si. No delicado âmbito da privacidade, é preciso agir com respeito, consideração e muito tato. Assim se preserva o que há de mais íntimo e evitam-se dolorosas ressacas morais, com arrependimentos, culpas e mágoas. Compartilhar sem invadir e sem se permitir ser invadido é a forma mais saudável e generosa de se conduzir uma relação e aprofundar o laço amoroso. Luisa Mascarenhas - Psicóloga RJ